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Jorge Rosa: “Portugal tem de se afirmar junto dos fabricantes de automóveis”

Indústria automóvel representa 7,4% do PIB português e tem 90 mil trabalhadores. A transição ambiental, no entanto, pode criar dissabores a este cluster.

Dias 5 e 6 de setembro, o futuro da indústria automóvel vai ser debatido numa conferência promovida pela Mobinov. A associação que reúne fábricas de carros, de peças e o comércio está preocupada com o resultado da transição energética, digital e demográfica e não quer que Portugal fique para trás.

Em entrevista ao ECO, o presidente da Mobinov pede que o Estado ajude as empresas a captarem novos investimentos para o país. Jorge Rosa também destaca a necessidade de acarinhar um setor que dá emprego direto a 90 mil pessoas, representa 7,4% do PIB e gera um volume de negócios anual de 15 mil milhões de euros, “dos quais 99% são exportados”.

Disse recentemente que “a curto e médio prazo teremos o setor que o Estado nos permitir”. Pensa que o cluster automóvel é bem tratado em Portugal?

De uma forma em geral, o setor automóvel tem tido bastante atenção do Governo português e tem sido ouvido sempre que pede. Claro que o setor queria mais: precisa de ganhar escala e uma outra dinâmica. Isso, naturalmente, exige o apoio do Estado e do Governo. Por isso somos sempre credores de mais atenção.

Que setor automóvel poderemos ter com apoio financeiro do Estado e sem apoio? Quais seriam as principais diferenças?

Os desafios que temos pela frente, com a transição energética, digital, ambiental e demográfica, além da necessidade de termos pessoas em qualidade e em quantidade são enormes e exigem do Estado uma atenção muito especial. O nosso setor precisa destes apoios.

Para lá do apoio financeiro, que é muito importante em várias áreas, diria que há o lado da promoção do setor junto do exterior e das principais fabricantes de automóveis. Aí também o papel do Estado é muito importante. Portugal tem de se afirmar junto dos fabricantes de automóveis e tem de fazer parte das estratégias de abastecimento das marcas, que hoje estão a repensar toda a cadeia de valor face aos problemas que a disrupção recente da guerra trouxe ao setor. Portugal pode ver nisto, em nossa opinião, uma grande oportunidade, por estar na Europa, ser um país relativamente perto do centro do continente e estar perto do segundo fabricante de automóveis europeu (Espanha). A afirmação no exterior passa muito pelas empresas – que têm de apresentar-se junto das fabricantes – mas também carece do apoio do Estado.

É por exemplo o que já se fez neste ano, na feira da indústria de Hannover, onde estiveram muitos fabricantes e onde o Governo português fez uma manifestação clara de apoio ao setor. Este tipo de ações e outras ainda mais musculadas podem promover a nossa indústria lá fora de forma a ganharmos escala cá dentro.

“Portugal tem de se afirmar junto dos fabricantes de automóveis e tem de fazer parte das estratégias de abastecimento das marcas, que hoje estão a repensar toda a cadeia de valor face aos problemas que a disrupção recente da guerra trouxe ao setor” Jorge Rosa

A presença de Portugal na Hannover Messe já teve efeitos?

As reações que temos das empresas participantes são de muita satisfação, porque foram muito abordados. Mas ainda não temos dados concretos, nesta altura, de negócios já fechados.

O aparecimento de uma nova fábrica de automóveis também é sempre uma ambição do setor e aí o Governo tem um papel fundamental na atração de novos investimentos. No entanto, a capacidade instalada na Europa é superior à procura. São considerações que têm de ser tidas em conta pelas fabricantes.

Para nós também é importante o ciclo do lítio: as baterias são um componente fundamental e vão ser determinantes para o futuro da indústria automóvel no curto prazo. Tendo nós o lítio instalado, a discussão sentida sobre o ciclo do lítio e a possibilidade de extrairmos – e sermos capazes de produzir ou células em Portugal para fornecermos mercados tão fortes como Espanha – seria um fator muito importante para o desenvolvimento de uma nova área com que inevitavelmente teremos de lidar.

Estamos a chegar ao final de 2022 e ainda não há planos para a produção de um automóvel elétrico em massa em Portugal. Não corremos o risco de estarmos a ficar para trás na indústria automóvel?

O risco naturalmente existe. No cluster não temos informações de cada uma das fábricas de automóveis em Portugal mas sabemos que todas estão a trabalhar no sentido de ter modelos elétricos em Portugal e acredito que é isso que vai acontecer. Cada uma das fábricas instaladas vai ter uma solução elétrica no muito curto prazo, não tenho dúvidas disso, embora elas não estejam oficialmente anunciadas.

Na transição da indústria automóvel, há condições para criar novos empregos ou a prioridade é segurar os que já existem?

A principal prioridade é segurar empregos mas o nosso desejo é que possa crescer. Aguentar cerca de 8% do PIB de Portugal seria muito importante.

“As baterias são um componente fundamental e vão ser determinantes para o futuro da indústria automóvel no curto prazo. Tendo nós o lítio instalado, a discussão sentida sobre o ciclo do lítio e a possibilidade de extrairmos – e sermos capazes de produzir ou células em Portugal para fornecermos mercados tão fortes como Espanha – seria um fator muito importante para o desenvolvimento de uma nova área com que inevitavelmente teremos de lidar” Jorge Rosa

É possível segurar empregos quando nos automóveis novos há menos peças para produzir?

É verdade mas há outras oportunidades, como o ciclo do lítio. Mas um veículo terá sempre pneus, chassis, peças estampadas, estofos…estamos todos naturalmente preocupados mas os momentos de transição são de riscos e de oportunidades. Temos de saber agarrar as oportunidades e tenho a certeza de que estamos a trabalhar nesse sentido.

Qual vai ser o papel do automóvel no futuro da sociedade, considerando, por exemplo, as limitações no acesso às cidades?

Obviamente o automóvel, com uma parcela importante na emissão de gases de estufa, é sempre um alvo. A tentativa de reduzir o número de carros está na cabeça de todos os que gerem as grandes cidades. Claro que há o risco de redução dos volumes [de produção] porque a mobilidade nas cidades será cada vez mais feita através de transportes públicos. Mas não há ainda estudos que mostrem uma redução massiva do número de carros nas cidades. A acontecer, a principal redução do número de carros será na Europa.

O hidrogénio poderia ser utilizado nos atuais carros a combustão, reutilizando a atual frota automóvel?

Há estudos nesse sentido e há possibilidades técnicas, embora ainda não haja muita maturidade. O hidrogénio, como combustível, é ideal para o transporte de longo curso e será o passe seguinte ao elétrico.

Fonte: ECO

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